sábado, 30 de setembro de 2006

Salir d’Outrora

O Cónego da Sé
Há registo de sete clérigos nascidos em Salir de Matos: Frei Xisto de Selir, monge cisterciense, teólogo eminente, viveu e faleceu no Mosteiro de Alcobaça, onde escreveu «Vidua Sereptana Moraliter Explanata»[1]; Frei Lamberto de Selir, monge e copista cisterciense, que no Mosteiro de Alcobaça copiou várias obras, entre as quais o Códice LXXI; João Lopes Torres, vigário da paróquia de Salir de Matos a partir de 1621[2], Diogo Ribeiro, cónego da Sé de Coimbra; António Joaquim do Souto, vigário da paróquia de Salir de Matos a partir de 5 de Junho de 1788[3]; Francisco António do Souto, vigário da Igreja de Nossa Senhora da Ajuda, da Vestiaria, a partir de 15 de Dezembro de 1780[4]; José da Felicidade Alves, pároco de Santa Maria de Belém a partir de 1956, celebrizado pela sua oposição ao regime político totalitário e pela sua obra de investigação histórica, ignorado e esquecido pela terra que o viu nascer, recordado e homenageado pela Câmara Municipal de Lisboa, que em deliberação unânime de 23 de Junho de 2004 atribuiu o seu nome a uma rua da cidade[5].

Visa esta crónica a revelação em meia dúzia de linhas, de breves apontamentos sobre o poderoso cónego da Sé de Coimbra - Diogo Ribeiro, com apoio nas referências que nos deixou Frei Manuel de Figueiredo (Memórias Para Formar a História da Comarca de Alcobaça - BN, Cod. 1479[6] e História Corográfica da comarca de Alcobaça - BN Cod. 1484), e na preciosa informação prestada por Hugo Ribeiro da Silva, autor de "Os Capitulares da Sé de Coimbra (1620-1670)". [Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2005, vol. 1, pp. 28-29. Dissertação de Mestrado em Estudos Locais e Regionais apresentada à FLUP][7].

Refere o cronista cisterciense, que Diogo Ribeiro nasceu na Vila de Salir do Mato, sendo filho de Álvaro Ribeiro, e que no testamento elaborado em Coimbra em 29 de Agosto de 1650, instituiu o vínculo de Santa Marta - limite da Vestiaria, com obrigação celebração de seis missas por semana na ermida do referido lugar, estabelecendo para o respectivo Capelão uma côngrua de 20.000 réis, um moio de trigo (correspondente a 60 alqueires) e uma courela de vinhas, tendo ainda instituído «na Capella da Real Caza de Nossa Senhora da Nazareth», outro vínculo, de onde decorria a obrigação de celebração de seis missas por semana, sendo uma em cada mês por el-Rei D. João IV «enquanto vivo e depois de morto».

Do trabalho de investigação de Hugo Ribeiro da Silva, chega-nos a informação de que Diogo Ribeiro frequentou a Universidade de Coimbra (Cânones) entre 1634 e 1640, sendo parente da mulher de Jacinto de Magalhães, irmão do deão da Sé - Pedro de Magalhães.

É manifesto o poder económico do cónego Diogo Ribeiro, revelado na instituição dos vínculos referidos, e ainda em dois actos notariais referidos pelo mesmo autor - Hugo Ribeiro da Silva[8], ambos celebrados na casa de Diogo Ribeiro: escritura datada de 2 de Setembro de 1641, através da qual o cónego empresta 100 mil reis a Simão Domingues, morador e feitor na quinta de Antanhol, pertencente a João da Cunha, fidalgo da casa de Sua Majestade, e a António Serqueira, mercador de Coimbra «à razão de juro de 16 por mil, por um ano»; e escritura datada de 4 de Agosto de 1645, que formaliza o empréstimo por parte do cónego a João Baptista (tabelião), de Coimbra, de 100 mil réis a 5% de juro por ano, sendo testemunhas: António Rebelo, pajem do cónego e João de Almeida «homem de pé do cónego».

Diogo Ribeiro terá falecido no dia 27 de Novembro de 1650, encontrando-se sepultado na Sé de Coimbra, tendo sido contemporâneo de um outro filho ilustre de Salir - Mateus do Couto - que veio a falecer no ano de 1664, depois de percorrer um longo caminho entre a humilde forja do seu pai em Salir do Mato e as funções de arquitecto do Rei, das Ordens Militares de Santiago e de Aviz, e do Tribunal do Santo Ofício (autor de um Tratado de Arquitectura, que escreveu em 1631).

Em vão procurou o autor desta crónica, na Sé Velha de Coimbra, a lápide da sepultura de Diogo Ribeiro, mas não há registo na pedra, deste salirmatense que um dia trocou a vila rural pela cidade do conhecimento.
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[1] Frei Manuel de Figueiredo, in "Correcçoens e Addiçoens Relativas aos Escriptores Cistercienses", a fls. 68 refere que este escrito, em pergaminho, datado do fim do Séc. XIII ou início do Séc. XIV, se encontra no Real Mosteiro de Alcobaça, sendo composto por três livros com iniciais desenhadas a vermelho e verde, muitas delas folheadas a duas ou mais cores (BN. Cod. XLII/239).
[2] IANTT, Most. Alcobaça, Livro 32, cx 22, fls. 104.
[3] IANTT, Most. Alcobaça, Livro 17 (Dataria), fls. 347.
[4] IANTT, Most. Alcobaça, Livro 17 (Dataria), fls. 519vº.
[5] Vide Gazeta das Caldas, ed. de 8 de Outubro de 2004.
[6] Manuscrito - página digitalizada e publicada nesta edição.
[7] Agradece-se reconhecidamente a informação facultada por este autor.
[8] Os Capitulares da Sé de Coimbra (1620-1670). Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2005 [Dissertação de Mestrado em Estudos Locais e Regionais apresentada à FLUP].

In Gazeta das Caldas

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