terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Alcobaça, a Nossa Micro-Economia e o Fantasma da China

A pergunta surgiu-me naturalmente, quando atravessávamos uma das zonas industriais da cidade alemã de Leipzig. _ Não está a industria alemã a ser afectada por esta crescente força de mobilização da produção industrial para a China?
_ Não! _ Respondeu o meu colega nascido nesta mesma província da Saxónia.
Na realidade a indústria alemã atravessa um bom momento, com um aumento de encomendas e consequente volume de exportações.
Os alemães não receiam a China. Aliás, conseguem mesmo ver este grande país do Oriente de outra forma, como um mercado emergente, de grande potencial e uma grande oportunidade de negócio. A China, para além de grande produtor, é também um gigantesco consumidor, em especial de produtos de luxo, mercado em grande expansão e que muito tem atraído as principais marcas mundiais deste segmento. É aí que se torna no alvo preferido de empresas como a Porshe, Audi, Mercedes, etc.
Este é um pequeno exemplo, mas muito expressivo deste fenómeno, que tem transfigurado a economia mundial.

Em Portugal, o lado oposto desta realidade, não se consegue esta percepção e está sempre presente o lado ameaçador do mercado Asiático. E isto porquê? Porque sofre tanto a indústria portuguesa com esta abertura aos novos e emergentes mercados do outro lado do globo? Que diferenças há então entre a nossa indústria e a alemã?
A resposta é simples e a diferença é só uma. Desde sempre que os empresários portugueses, com os alcobacenses incluídos, optaram pela via mais fácil, pela produção em função das encomendas de terceiros, dos grandes grupos, das grandes marcas. Sim, é na criação da Marca que está a diferença. Os nossos empresários nunca conseguiram criar as marcas próprias, a sua identificação do seu produto e a sua imagem. Isto, associado a uma posterior divulgação no mercado nacional e até mesmo exterior, em especial Europeu.

Que interessa produzirmos os melhores sapatos, as melhores roupas, o melhor vidro, se depois esses produtos são vendidos para fora e etiquetados com marcas estrangeiras sem qualquer referência ao nosso país? Que vantagem tem a economia portuguesa, quando esses produtos são vendidos pelas nossas fábricas a preços baixíssimos, com reduzidíssimas margens de lucro? Na realidade o produto chega ao consumidor final com um preço elevado, mas a margem mais significativa, o grande lucro fica na Marca, não em quem produz. Podemos imaginar um telemóvel da Nokia que é produzido numa qualquer fábrica da Ásia por 50€ e que depois é vendido por cerca de 400€. A marca compra barato e vende caro, obtendo assim um lucro bastante expressivo.

A produção industrial quer-se barata e é onde se verifica uma maior competição. As suas margens de lucro são reduzidas aos mínimos para se conseguirem bons contratos e tornam-se assim insignificantes. A maior fatia cabe sempre à marca, que na quase totalidade das vezes é um grande grupo estrangeiro, como a Timberland, a Benetton ou a Lacoste. Todos sabemos que são produzidas cá, mas que nos dão muito pouco...

A somar a este problema da pouca rentabilidade está o também já referido factor da elevada concorrência e grande competição de preços, e que tanta produção tem então levado para a China e países limítrofes.

São estas as grandes desvantagens, e é por isto que a Alemanha não é afectada. As marcas são suas. A Audi, Porshe, Mercedes e outras marcas até como a Siemens são Alemãs. Até podem transferir alguma da sua produção para outros mercados, mas têm controlo nela, e as suas principais fábricas não saem do seu país.

Analisando a realidade de Alcobaça, o filme é o mesmo. Possuímos por exemplo faiança da melhor qualidade mas que no entanto atravessa uma crise implacável. Custa-me ver que produtos lindíssimos como os nossos não tenham grande futuro porque infelizmente falhámos na criação das nossas marcas. Custa-me chegar a grandes armazéns como o Karstadt na Alemanha, as Galerias La Fayette em França ou até mesmo o El Corte Inglês em Portugal ou Espanha e encontrar inúmeras marcas de porcelanas e outros produtos e nenhuma delas ser portuguesa. Ainda mais quando sei que muitos desses produtos até podem ter sido produzidos entre nós.

Poderíamos facilmente lá entrar e encontrar uma secção por exemplo das cerâmicas S. Bernardo, Raul da Bernarda, etc. Podiam ser estas, imagens de marca destes produtos, as formas como as pessoas os identificariam e a confiança que lhes depositariam. Ao invés de termos loiças da "Leonardo" ou "Sander" teríamos das nossas próprias marcas, que venderiam igualmente os seus produtos, a preços bastante superiores ( aos que são vendidos actualmente à marca ) e com margens de lucro obviamente maiores. Positivo para as empresas, para os seus funcionários que até poderiam auferir maiores salários e para a economia do país.

A China, seria então desta forma olhada como mais um potencial mercado de venda. Estou certo que as nossos produtos, se devidamente divulgados e conhecidos seriam facilmente vendidos em lojas da cosmopolita Shangai ou Hong-Kong.

Teria no entanto de haver um outro tipo de gestão e orientação destas empresas, que teriam de deixar a sua estrutura familiar e recrutar grandes "experts" das áreas de marketing, publicidade, comercial, etc. Um outro tipo de investimento cujos frutos trariam um outro tipo de futuro para todos. É isto que também assusta os nossos empresários, que têm medo de perder o controlo daquilo que criaram e de abrir mão de algo que não querem ver nas mãos de outros. É o preço do crescimento e da afirmação.

Felizmente, já vamos assistindo a alguma tendência neste sentido e temos até um bom exemplo em Alcobaça. Após a criação da marca "Maçã de Alcobaça", o seu volume de vendas cresceu significativamente. Conseguimos criar a marca, e conseguimos vendê-la!

Importa agora que sejamos capazes de generalizar este conceito sob pena de perdermos toda a nossa capacidade de criação. Ficaremos num vazio se nada for urgentemente feito e acabaremos por andar à míngua sob a dependência de estranhos que não têm quaisquer preocupações connosco.

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